"Que te devolvam a alma homem do nosso tempo. Pede isso a Deus ou às coisas que acreditas: à terra, às águas, à noite desmedida. Uiva se quiseres, ao teu próprio ventre se é ele quem comanda a tua vida, não importa... Pede à mulher, àquela que foi noiva, à que se fez amiga. Abre a tua boca, ulula, pede à chuva. Ruge como se tivesses no peito uma enorme ferida, escancara a tua boca, regouga: A ALMA. A ALMA DE VOLTA." (Hilda Hilst)



23/12/2011

Nesse Natal, coloque os seus sonhos aos Ojos de Dios!

“Rezar muito e ter fé. Porque as coisas estão todas amarradinhas em Deus.” (Guimarães Rosa)


O Natal é um momento sagrado, por diversos motivos, mas todos apontam para o Centro, para o que nos é essencial, e que está na base de tudo o que desejamos, acreditamos e esperamos viver. Por isso, alude à idéia de renascimento, ao símbolo da Criança Divina que nos coloca em contato com nossos sonhos de felicidade, bem aventurança e contentamento... Tantos quantos forem os nomes que os homens derem para Deus, assim também serão as formas de festejarmos, compartilhando com a família humanidade os frutos colhidos da Árvore da Vida a partir desses sonhos acessados no céu estrelado (cada estrela um dom divino à espera de ser despertado em nós) e semeados na terra onde trilhamos a nossa existência.
“Tudo, aliás, é a ponta de um mistério, inclusive os fatos. Ou a ausência deles. Duvida? Quando nada acontece há um milagre que não estamos vendo.” (Guimarães Rosa).


Como dizem os hindus:

"Deus é um círculo cujo centro está em toda parte e a circunferência em nenhuma". E como falou sabiamente Alce Negro a partir de um sonho iniciático:

"Mas todo lugar é o centro do mundo, e lá eu via de uma maneira sagrada, a forma de todas as coisas no espírito, e a forma de todas as formas, como teriam que viver juntas como um único ser. E vi que o aro sagrado de meu povo era um de muitos aros que formavam um único círculo, largo como a luz do dia e a luz das estrelas, e no centro dele crescia uma única majestosa árvore florida, que abrigaria todas as crianças de uma única mãe e um único pai.”


Uma forma bonita de trazermos para a realidade essas sementes de amanhãs nesse Natal pode ser confeccionando e pendurando em nossa Árvore de Natal Ojos de Dios ou Olhos de Deus, recurso que eu pesquisei para poder utilizar essa atividade no trabalho arteterapêutico (copio do meu livro Vol 1: Temas centrais em Arteterapia, o trecho abaixo que conta com que fim esses objetos eram confeccionados):

"Os “olhos de Deus” eram confeccionados por povos ancestrais da África e da América Central (México, Peru), sendo também encontrados no Oriente. No México, o “olho mágico” é pendurado do lado direito da porta de entrada de uma casa, como amuleto de proteção. Esses povos teciam um “olho de Deus” quando nascia uma criança: o miolo representa os olhos de Deus sobre essa criança, protegendo-a, e os fios coloridos representam os pedidos feitos a Deus, como por exemplo: sorte, saúde, amor, etc. Esse objeto era então pendurado em seu berço, e a cada ano de vida um novo “olho de Deus” era confeccionado. Considerava-se que quando essa criança tivesse 5 anos, ela já seria então capaz de confeccionar os seus próprios “olhos de Deus”, fazendo-o a cada aniversário seu." (in: BERNARDO, 2008).

Sendo assim, podemos confeccionar Ojos de Dios na época do Natal marcando o seu contro com a cor que represente a semente divina dentro de cada um de nós (escolha a cor que para você o sagrado, a luz, a dimensão divina) e escolha uma cor diferente para representar cada pedido seu para o novo ano, você pode também confeccionar Olhos de Deus para presentear os amigos e parentes, e até mesmo para Gaia (o nosso lindo planeta Terra), expressando o que deseja para todos (para todos os nossos parentes que convivem conosco na Terra: homens, plantas, pedras, animais...) e pendurá-los todos em alguma árvore ou planta. E um conto que pode ser trazido à cena, inspirando a confecção de Ojos de Dios (que podem ser feitos por todas as pessoas de uma família, ou num grupo, por exemplo), é Os Sete Novelos (copio abaixo o resumo dessa história do meu livro Vol 1):
"Esse conto começa com um rei viúvo que tem 7 filhos, os quais vivem em desacordo, fato que preocupa bastante o pai. Quando o rei morre, os filhos ficam sabendo que têm um único dia para aprenderem a conviver pacificamente: recebem um novelo de seda de cor diferente cada um, e devem conseguir transformar esses novelos em ouro para receberem a herança de seu pai. Decidem então confeccionar com os sete novelos um único tecido, que é transformado em ouro ao ser vendido no mercado por uma quantia generosa paga em moedas de ouro, e ao final dessa tarefa aprendem o valor da cooperação, recebendo sua herança, além de decidirem dali para a frente ensinar às pessoas de sua aldeia a transformar fios coloridos de seda em ouro." (in: BERNARDO, 2008).

“As coisas assim a gente não perde nem abarca. Cabem é no brilho da noite. Aragem do sagrado. Absolutas estrelas". (G. Rosa).

"Vem cá, senta hoje ao meu lado,
olha junto comigo para o céu
depois de um dia de trabalho
depois de rir e chorar, falar e calar (...)

O que resta de nós na noite escura?
Temores? Tremores? Certezas? Dúvidas?
Cheiros? Cores? Vertigens? Funduras? (...)

De você, quero o olhar que me reconhece
chama acesa no centro do peito.
De mim, verte esperança...
De nós dois, quero os sonhos que se possam concretizar.

Por isso, olha para o céu e me diz: qual dessas estrelas
é semente de manhã que se possa cultivar?

Porque todos os sonhos são sementes
e todas as estrelas são guias...
(trechos de um poema meu, 1999)

16/12/2011

"A Infinita Fiandeira", conto de Mia Couto

Qualquer semelhança entre a aranha, o artista e o arteterapeuta não é mera coincidência... A arte etrelaça o homem à teia de todas as nossas relações, mas nem sempre isso é compreendido por quem não sabe olhar através do palpável, e assim vislumbrar as infinitas possibilidades de recriar a Vida! Como escreveu Mia Couto na epígrafe do seu livro de contos: "O Fio das Miçangas":



A miçanga, todos as vêem. Ninguém nota o fio que, em colar vistoso, vai compondo as miçangas. Também assim é a voz do poeta: um fio de silêncio costurando o tempo.




A INFINITA FIANDEIRA

A aranha, aquela aranha, era tão única: não parava de fazer teias! Fazia-as de todos os tamanhos e formas. Havia, contudo, um senão: ela fazia-as, mas não lhes dava utilidade. O bicho repaginava o mundo. Contudo, sempre inacabava as suas obras. Ao fio e ao cabo, ela já amealhava uma porção de teias que só ganhavam senso no rebrilho das manhãs.
E dia e noite: dos seus palpos primavam obras, com belezas de cacimbo gotejando, rendas e rendilhados. Tudo sem nem finalidade. Todo bom aracnídeo sabe que a teia cumpre as fatias funções: lençol de núpcias, armadilha de caçador. Todos sabem, menos a nossa aranhinha, em suas distraiçoeiras funções.
Para a mãe-aranha aquilo não passava de mau senso. Para quê tanto labor se depois não se dava a indevida aplicação? Mas a jovem aranhiça não fazia ouvidos. E alfaiatava, alfinetava, cegava os nós. Tecia e retecia o fio, entrelaçava e reentrelaçava mais e mais teia. Sem nunca fazer morada em nenhuma. Recusava a utilitária vocação da sua espécie.
- Não faço teias por instinto.
- Então, faz porquê?
- Faço por arte.
Benzia-se a mãe, rezava o pai. Mas nem com preces. A filha saiu pelo mundo em ofício de infinita teceloa. E em cantos e recantos deixava a sua marca, o engenho da sua seda. os pais, após concertação, a mandaram chamar. A mãe:
- Minha filha, quando é que acentas as patas na parede?
E o pai:
- Já eu me vejo em palpos de mim...
Em choro múltiplo, a mãe limpou as lágrimas dos muitos olhos enquanto disse:
- Estamos recebendo queixas do aranhal.
- O que é que dizem, mãe?
- Dizem que isso só pode ser doença apanhada de outras criaturas.
Até que se decidiram: a jovem aranha tinha que ser reconduzida aos seus mandos genéticos. Aquele devaneio seria causado por falta de namorado. A moça seria até virgem, não tendo nunca digerido um machito. E organizaram um amoroso encontro.
- Vai ver que custa menos que engolir mosca - disse a mãe.
E aconteceu. Contudo, ao invés de devorar o singelo namorador, a aranha namorou e ficou enamorada. Os dois deram-se os apêndices e dançaram ao som de uma brisa que fazia vibrar a teia. Ou seria a teia que fabricava a brisa?
A aranhiça levou o namorado a visitar sua coleção de teias, ele que escolhesse uma, ficaria prova de seu amor.
A família desiludida consultou o Deus dos bichos, para reclamar da fabricação daquele espécime. Uma aranha assim, com mania de gente? Na sua alta teia, o Deus dos bichos quis saber o que poderia fazer. Pediram que ela transitasse para humana. E assim sucedeu: num golpe divino, a aranha foi convertida em pessoa. Qaundo ela, já transfigurada., se apresentou no mundo dos humanos logo lhe exigiram a imediata identificação. Quem era, o que fazia?
- Faço arte.
- Arte?
E os humanos se entreolharam, intrigados. Desconheciam o que fosse arte. Em que consistia? Até que um, mais-velho, se lembrou. Que houvera um tempo, em tempos de que já se perdera memória, em que alguns se ocupavam de tais improdutivos afazeres. Felizmente, isso tinha acabado, e os poucos que teimavam em criar esses pouco rentáveis produtos - chamados de obras de arte - tinham sido geneticamente transmutados em bichos. Não se lembrava bem em que bichos. Aranhas, ao que parece.

29/11/2011

10/12: Sarau e lançamento do meu novo livro!

O seu coração era o lugar onde o rio e as plantas, as árvores e o ar se podiam visitar, fundir, excitar-se mutuamente e celebrar festas de amor. (H. Hesse)


10/12 (sábado) - a partir das 20hs, no meu consultório:

SARAU E LANÇAMENTO DO MEU LIVRO: Coleção A Prática da Arteterapia - Vol VI:

Amor, Sexualidade, o Sagrada e a Arteterapia:
Aproximações mitológicas entre Oriente e Ocidente

Venha compartilhar os seus talentos e viver momentos especiais, com apresentações musicais, performances teatrais, e o que mais vocês quiserem apresentar! Traga os seus amigos, o que você quiser beber e um prato de comida, e se quiser traga também 1 quilo de alimentos não perecíveis (que serão doados), assim não faltará comida nem bebida para ninguém.


A beleza não é um atributo como uma película envolvendo uma virtude, meramente o aspecto estético da aparência. Se não houvesse beleza, junto com a bondade e a verdade e o uno, nunca poderíamos senti-los, conhecê-los. A beleza é uma necessidade epistemológica, é o modo como os Deuses tocam os nossos sentidos, alcançam o coração e nos atraem para a vida. (J. Hillman)

Durante o sarau, haverá também o lançamento do meu novo livro aqui em São Paulo, será maravilhoso compartilhar com vocês a alegria de mais esse nascimento, com muito amor!


O amor é um sentimento tão grande
Que é preciso crescer por dentro para
Que ele possa entrar
É o único lugar onde o medo não pode morar.
É um lago tão quieto que confusão alguma pode perturbar.
É um fogo tão quente que até a dor pode transformar.

(Patrícia Gebrim)


"... Há de surgir uma estrela no céu cada vez que ocê sorrir ... Hum! Deus fará absurdos contanto que a vida seja assim... Sim, um altar onde a gente celebre tudo o que Ele consentir..."

(Gilberto Gil, Estrela)

02/11/2011

"Dia de muertos"

...Oh, arco trêmulo e retesado,
Quando o punho violento da saudade
Exige que da vida os dois pólos
Curvados se aproximem!
Vezes e mais vezes, incessantemente,
Me lançarás, me perseguirás,
Da morte ao nascimento,
No doloroso caminho das configurações,
No maravilhoso caminho das configurações.”

(H. Hesse)

Quando estive em Oaxaca, México, tive a oportunidade de participar dos festejos do “dia de muertos”. Segundo o mito mexicano, nos primeiros dias de novembro os mortos têm a permissão divina para atravessar o portal que separa o mundo dos vivos do mundo dos mortos, visitar seus parentes e amigos (vivos) e com eles festejar a vida. Todos os estabelecimentos comerciais se enfeitam, geralmente com caveiras que aparecem confraternizando com os vivos em banquetes, tocando, dançando e cantando. Os mercados vendem doces em forma de caveira, e há até pães “de muertos“, feitos especialmente para essa data. Nas casas erguem-se belíssimos altares, construídos com flores, frutas, chocolates, bebidas, velas (que são acesas à noite), e às vezes até alguns objetos; nesses altares são colocadas comidas e bebidas que os mortos de cada família gostavam de consumir.
Nos festejos do “dia de muertos” acontece uma procissão dedicada à Nossa Senhora de Guadalupe (padroeira de Oaxaca, que corresponderia à Nossa Senhora de Aparecida para nós), e depois as pessoas se dirigem aos cemitérios onde estão enterrados os seus familiares.Os túmulos são decorados e cuidadosamente preparados para essa celebração, e todos ceiam sobre esses mesmos túmulos, num clima de grande festa, acompanhada até de fogos de artifício. No entanto, também se chora de saudades pelos que foram, pois não se trata de negar a dor da perda que a morte traz, mas se reconhece que a morte está incluída na “Roda da Vida” (“Roda de Cura” indígena) como uma de suas etapas: à morte segue-se o renascimento. Na verdade, essa grande festa constitui-se numa celebração da vida, que por trás do manto da morte se recria e adquire novas formas


Eu começo a minha tese de doutorado, e o meu livro Vol II: Mitologia Indígena e Arteterapia: A Arte de Trilhar a Roda da Vida, contando sobre essa minha experiência vivenciada durante um workshop do qual participei em Oaxaca: "Incubação de Sonhos", e comentando o sentido dessa voisão cíclica da vida para o homem de hoje. Conforme indígenas mexicanos me ensinaram lá, a Roda da Vida, ou “Roda de Cura”, representa a vida com suas sucessivas etapas, que se desenrolam em ciclos. Nessa roda, os quatro pontos cardeais são associados aos quatro elementos, a diferentes animais e cores, a diferentes fases da vida e de qualquer processo, indo da semente ao fruto colhido: cada fase de nossas vidas é comparável ao desdobrar-se da semente (nascimento) em fruto (velhice e morte), o que constitui-se num processo de transformação.
A vida de uma pessoa atravessa várias etapas (nascimento, adolescência, maternidade-paternidade, atuação social e profissional, morte, entre outras), e em cada uma delas há a oportunidade de aprendermos algo novo e importante sobre nós mesmos, sobre o outro e sobre o mundo à nossa volta. Esse aprendizado que as experiências de vida nos trazem, quando assimilado e integrado à nossa consciência, nos transforma, ampliando a nossa visão de homem e de mundo. E todo processo de transformação envolve a vivência de uma morte simbólica e de um posterior renascimento. Por saber disso, e para ajudar o homem a atravessar as crises que acompanham sempre esses processos de transformação, os povos ancestrais dispunham de rituais de iniciação e passagem.

Encontramos ainda hoje alguns desses rituais atuantes em nossa cultura (batismo, casamento, enterro, etc.), mas a maioria deles perdeu a conexão com um significado simbólico mais profundo do que se está vivenciando neles, constituindo-se nos dias de hoje, em sua maioria, em convenções vazias de seu sentido iniciático. Esses rituais tinham a função de favorecer o nosso crescimento através de um relacionamento significativo e auto-renovador com os diferentes ritmos e ciclos existenciais (estações do ano, plantio e colheita, nascimento e morte, casamento, puberdade, ofício, etc.), nos predispondo à abertura ao novo.

Como não dispomos mais de rituais para nos ajudar nesses momentos de crise que acompanham o nosso crescimento psíquico, a Arte pode nos oferecer a oportunidade de vivenciar esses momentos de forma mais integrada.


No México, a cruz tem flores em seus 4 cantos, ao invés da imagem do Cristo crucificado, simbolizando o néctar (a doçura) contido nos 4 pontos da Roda de Cura, que também é chamada da “Roda da Doce Medicina”, pois em todos os procedimentos indígenas de cura e de passagem de seus ensinamentos encontramos formas de expressão artística: canto, dança, narração de histórias, pintura, escultura..., ajudando-nos a extrair sabedoria, como néctar, de nossas experiências vividas, da mesma forma que o beija-flor se nutre do néctar das flores, e assim poliniza os jardins...

A vida é doce prá quem cultiva flores,
porque é delas que as abelhas retiram
os néctares de seu mel.

A vida é plena
prá quem, sobre seus túmulos, ergue altares,
fertilizando com suas lágrimas (como chuva)
suas semeaduras.

A vida faz sentido
prá quem se reconhece
nas tramas do próprio destino
e com seus fios tece horizontes...

A Vida encanta, acalanta, canta
prá quem dança, com alegria,
dentro da Roda da Medicina (Roda de Cura indígena)
fazendo da terra, da água, do fogo e do ar, remédios para suas
feridas (e prá quem se abre para fazer parcerias).

A Vida ilumina
quem acolhe seu devir de alquimista, transformando em ouro,
em tesouros, as pedras que encontra pelo caminho
(colocando-as, incandescentes, no centro do casulo de seus sonhos)
transmutando seus cestos de carga em sacolas de talismãs.

Oaxaca é aqui, é agora,
prá quem, a cada lua nova, se deita com o sol
e celebra, a cada lua cheia, a Vida que entrelaça todos os seres
e os impulsiona a renascer... “

(“Oaxaca”, minha autoria, 1999)

31/10/2011

Feliz dia das bruxas! Minha homenagem à mulher selvagem em cada um de nós...





As bruxas, mulheres que se dedicavam à fabricação de remédios e unguentos à base de ervas, que cultuavam a fertilidade da terra, que honravam as forças da Terra, da Água, do Fogo e do Ar, e que compreendiam os ciclos como necessários à renovação da vida, foram queimadas em fogueiras nas quais também sacrificavam-se os gatos, animais associados ao feminino e seus mistérios, e com isso os ratos proliferaram... O resultado dessa crueldade foi a peste bubônica, e a ferida psíquica que apartou o matriarcado do patriarcado, ao invés de integrá-los amorosamente, pelo caminho do coração, impulsionando o nosso desenvolvimento em direção à alteridade, à intreração criativa entre as diferenças, entre as polaridades.
Mas nem sempre foi assim... Como escrevo no meu livro Vol VI: Amor, Sexualidade, o Sagrado e a Arteterapia, no capítulo: "A Prostituta Sagrada: o êxtase e o matrimônio interior":
"De acordo com Harding (1985), entre tribos ancestrais, eram feitos rituais à lua e ao seu poder fertilizador. Nesses rituais, cabia às mulheres “o cuidado com o suprimento da água e a guarda da chama sagrada, ou fogo sagrado, que representa a luz da lua e que não se pode permitir que se apague”. (p. 176-177). As sacerdotisas da lua “recebiam a energia fertilizante da divindade em suas próprias pessoas, como mulheres, sendo esta uma função efetuada para o benefício de toda a tribo”. (p. 177). Elas eram chamadas de virgens, pois não pertenciam a nenhum homem, não se casavam, e “em muitos lugares essas sacerdotisas eram prostitutas sagradas, que se davam a estranhos e aos fiéis adoradores da deusa”. (p. 182). (...)
Segundo Harding (1985), a prostituição sagrada era praticada principalmente pelas mulheres da realeza da Grécia e Ásia Menor, e na Babilônia “as filhas de famílias nobres se prostituíam no templo de Anaíta, a deusa lua do mazdeísmo, dedicando-lhes os primeiros frutos de sua feminilidade.” (p. 186). A autora também ressalta que “os ritos sexuais das bruxas tinham o significado de uma união com o poder divino, mas também era um rito mágico para assegurar a fertilidade (...) esses ritos correspondem aos que eram praticados nos antigos mistérios da deusa Lua”. (p. 192).

Harding (1985) comenta que os homens eram iniciados nos templos da deusa Lua pelas sacerdotisas, que incorporando a deusa em si, ritualizavam um hieros gamos (casamento sagrado), como “um sacramento de união com a natureza divina e feminina e também um ritual para a renovação de seus poderes de fertilidade.” (p. 193). Da mesma forma, também era desejável que as mulheres, pelo menos uma única vez na vida, tivessem a experiência de "dar-se não a um homem em particular, por amor a ele, isto é, por razões pessoais, mas à deusa, a seu próprio instinto, ao princípio Eros que nela existia. No hieros gamos, no matrimônio santo, não importava quem pudesse ser o homem, cuidava-se sim que ele não fosse o homem escolhido. Precisava ser um estranho. Não importava sequer o tipo de experiência que a mulher poderia ter. (...) Para a mulher, o significado da experiência devia residir na sua submissão ao instinto, não importando de que forma a experiência lhe acontecesse." (HARDING, 1985, p. 197).

Segundo Stein (1978), como no mundo atual não existem mais rituais que permitam essa vivência de forma integrada, possibilitando o amadurecimento sexual da mulher, sendo que mesmo a vivência da liberação sexual não a liberta dos conflitos que envolvem essa questão em sua psique, um dos caminhos para a mulher seria a aceitação de sua sexualidade indiferenciada sem se sentir vulgar, mas no sentido de ser tão livre quanto o homem “para permitir que as imagens sexuais penetrem na consciência”, e assim o seu animus “deixará de exigir que seja sempre aberta, pronta para o relacionamento e o amor, começando a aceitar o fato de que ela pode ser imaginativamente criativa em outras áreas além do relacionamento humano e ainda assim ser feminina”. (p. 147).
O poema de Bruna Lombardi mostra bem como essa “mulher selvagem”, “bruxa” ou “prostituta sagrada”, apesar de ter sido abafada, reprimida e condenada a partir da cisão do matriarcado com o patriarcado, bem como queimada viva na fogueira da Inquisição, ainda pode ser encontrada no âmago da mulher de hoje:

Ela é uma mulher que goza
celestial sublime
isso a torna perigosa
e você não pode nada contra o crime
dela ser uma mulher que goza
você pode persegui-la, ameaçá-la
tachá-la, matá-la se quiser
retalhar seu corpo, deixá-lo exposto
pra servir de exemplo.
É inútil. Ela agora pode resistir
ao mais feroz dos tempos
à ira, ao pior julgamento
repara, ela renasce e brota
nova rosa
Atravessou a história
foi queimada viva, acusada,
desceu ao fundo dos infernos
e já não teme nada
retorna inteira,
maior, mais larga
absolutamente poderosa.

Com isso, poderemos nos abrir para vivenciar relacionamentos entre dois seres humanos inteiros, não mais concebidos como “duas metades de uma mesma laranja” que se unem, o que dá margem à co-dependência que mata a criatividade e o potencial transformador do relacionamento conjugal, mas compreendendo que os parceiros podem auxiliar-se mutuamente a ter uma vida mais rica e criativa, e um contato mais profundo com a sua própria humanidade. Como bem coloca Stein (1978, p. 157): “A essência da criatividade, que pode manifestar-se tanto no relacionamento e no desenvolvimento humano como no trabalho criativo, é sempre o amor”." (BERNARDO, 2011, p. 209 - 213).

Feliz dia das bruxas, com muito amor... pela natureza, pela energia pulsante em cada átomo de vida, pela nossa natureza humano-divina!

(As colagens desse post são detalhes da colagem que fiz no meu piano).




06/10/2011

O meu novo livro!!! Amor, Sexualidade, o Sagrado e a Arteterapia

É com muita alegria e muito prazer que convido vocês para o lançamento do meu novo livro, durante o Congresso Internacional de Arteterapia (12 a 15 de outobro, em Ouro Preto), Coleção A Prática da Arteterapia - Vol VI

AMOR, SEXUALIDADE, O SAGRADO E A ARTETERAPIA
aproximações mitológicas entre Oriente e Ocidente


Só se pode viver perto de outro, e conhecer outra pessoa, sem perigo de ódio, se a gente tem amor. Qualquer amor já é um pouquinho de saúde, um descanso na loucura. (G. Rosa)


SUMÁRIO:
- MITOHERMENÊUTICA E ARTETERAPIA
- A “CAVERNA DO CORAÇÃO”
- AFRODITE - DEUSA DO AMOR, DA FERTILIDADE, DA BELEZA E DA ARTE
- O NASCIMENTO DE AFRODITE E SEU SÉQUITO DE DEUSAS
As Horas / A deusa Peito /
As Graças e as Musas / Aidos
- EROS

- SEXUALIADE SAGRADA - TANTRA, YOGA E A EXPANSÃO DA CONSCIÊNCIA
Shiva-Shakti / Hata Yoga
- OS CHAKRAS
- O TAO - YIN E YANG COMO OS BRAÇOS DO UM
- SCHERAZADE E AS 1001 NOITES - O PODER TRANSFORMADOR DA SEXUALIDADE E DO AMOR

- A PROSTITUTA SAGRADA: O ÊXTASE E O MATRIMÔNIO INTERIOR

O amor é antes de mais nada um movimento em busca de união. Talvez o amor seja o princípio de união e como tal é idêntico ao princípio criativo. Aqui chegamos ao cerne da questão. Se amor e desejo criativo são a mesma coisa, então a conexão humana é sem dúvida fundamental para a criatividade. Não se deve mais conceber o amor como algo cego, pois ele tem direção e visão. Além disso, o amor tanto pode transformar-se como causar transformação. Estou convencido de que o próprio homem se encontra em contínuo processo de criação em conseqüência das transformações sofridas pelo instinto criativo (Amor). (R. STEIN)

Convido também vocês que irão ao Congresso a assistir os trabalhos que eu apresentarei lá:

13 de outubro, das 14 às 16hs:
Workshop: Mitologia oriental e arteterapia: o amor, a conjugalidade, a sexualidade sagrada e a individuação

14 de outubro, das 16:30 às 18:30 hs
Palestra (mesa coordenada):
Contribuições das culturas ancestrais para o ensino: a integração eu-outro-meio-ambiente, a dimensão do sagrado e a Arteterapia

15 de outubro, das 8 às 10hs:
Palestra (mesa coordenada):
Sexualidade, amor humano e arteterapia: aproximações mitológicas entre oriente e ocidente na busca pelo ser integral

NAMASTÊ!
Eu saúdo você do lugar onde você e eu somos um

06/09/2011

MInha entrevista sobre Arteterapia no programa Sinais de Fumaça!

Consegui colocar no Youtube a minha entrevista sobre Arteterapia e Mitologia Indígena no programa Sinais de Fumaça, apresentado por Samuel Souza de Paula, no dia 23/08/2011. Ela está dividida em 4 partes, convido a todos a assisti-la! É sempre um grande prazer pode levar ao púbçlico mais informações sobre a Arteterapia, que trabalha na trilha da sabedoria ancestral, da Doce Medicina Indígena...







05/09/2011

Minha entrevista sobre Arteterapia no programa Web Divã em abril de 2010


Convido vocês a assistirem a uma entrevista que dei à AllTV sobre Arteterapia, para Renata Antonelli, no programa Web Divã, em abril/2010 - no início aparece uma banda e comerciais, mas passando por esse início, vocês assistem à minha entrevista. Espero que gostem!



Patricia Pinna from Felipe Vaz Guimarães on Vimeo.

02/09/2011

Programa Papo de Mãe: "meu filho é um artistta"

Eu tive o imenso prazer de participar, como especialista (psicóloga e arte-educadora), do programa Papo de Mãe, comentando juntamente com as mães e outros participantes sobre o tema: filhos artistas http://www.papodemae.com.br/search/label/Filhos%20artistas, apresentado por Mariana Kotscho e Roberta Manreza, na TV Brasil, que foi ao ar no dia 14 de agosto. O programa foi muito interessante. Filhos talentosos, mães dedicadas, a arte é sempre bem-vinda quando permite o florescimento de nossos potenciais, trazendo encanto e beleza para o mundo... Vale a pena assistir!




Programa Papo de Mãe - Filhos Artistas - Parte 1 por papodemae


Programa Papo de Mãe - Filhos Artistas - Parte 2 por papodemae


Programa Papo de Mãe - Filhos Artistas - Parte 3 por papodemae

24/08/2011

Nessa sexta, 26/08, darei a palestra: Arteterapia e Saúde Integral em Pindamonhangaba

Nessa sexta, 26 de agosto, terei o imenso prazer de falar sobre Arteterapia e Saúde Integral para os participantes do 3o Fórum do Centro de Práticas Integrativas e Complementares de Pindamonhangaba, a convite da querida amiga Arteterapeuta Maria de Fátima Barros, que tem feito um lindo trabalho levando a Arteterapia para o Centro de Práticas Integrativas da Prefeitura Municipal de Pindamonhangaba, que congrega Homeopatia, Fitoterapia, Alimentação Saudável, Arteterapia, Lian Gong e Terapia Comunitária. É uma honra poder contribuir de alguma forma para um projeto tão importante e bem-vindo como esse! A Prefeitura Municipal de Pindamonhangaba, em 27 de abril de 2007, instituiu uma portaria que regulamenta as Práticas Integrativas de Saúde no âmbito municipal. Exemplo a ser seguido e parabenizado!!!

22/08/2011

Nessa terça, 23 de agosto, estarei dando uma entrevista sobre Arteterapia e Xamanismo!



Nessa terça, dia 23 de agosto, das 19 às 2ohs, estarei novamente sendo entrevistada por Samuel Souza de Paula, dessa vez falando sobre Arteterapia e Xamanismo no programa Sianis de Fumaça, pela internete, com participação pelo chat ao vivo! Para assistir é só entrar no site: http://www.biosegredotv.com.br/ Vou adorar responder perguntas de vocês no programa!

14/08/2011

A entrevista que dei sobre Criatividade já está em vídeo, os convido a assistir!

Dia 5 de agosto tive o prazer de ser mais uma vez entrevistada por Renata Antonelli, dessa vez o tema foi sobre Criatividade, no programa Webdivâ, que foi ao ar pela allTV, assistam a essa entrevisa abaixo!




Renata Antonelli entrevista Patrícia Pinna sobre Criatividade - webdivâ na allTV from Patrícia Pinna on Vimeo.

04/08/2011

Dia 5/8 darei uma entrevista sobre Criatividade na allTV! Participe pelo chat!

Nessa sexta, dia 5 de agosto, eu serei entrevistada no programa Web Divã falando sobre Criatividade e Arteterapia, das 21 às 22hs. O programa é pela allTv, é só entrar no link: http://www.alltv.com.br/ e dá para participar ao vivo pelo chat, vou adorar se vocês puderem assistir e participar!!!

10/07/2011

Dia 16 de julho estarei em Salvador dando o curso: Mitologia, Amor Humano e Arteterapia

É com grande alegria que volto a Salvador, dessa vez para dar um mini-curso sobre Mitologia, Sexualidade sagrada e Arteterapia, vou adorar encontrá-los lá! Vejam abaixo detalhes sobre o curso, e a programação completa e como inscrever-se na agenda de cursos desse blog: http://patriciapinna.blogspot.com/p/agenda-cursos.html



MITOLOGIA, AMOR HUMANO E ARTETERAPIA:

O amor, a conjugalidade, a sexualidade sagrada e a Arteterapia

Sábado - 16/07/2011 9:00 às 18:00 hs

Nesse curso, que é vivencial e teórico, trabalharemos com mitos e contos (e recursos arteterapêuticos associados a eles) que nos ajudam a compreender o sentido e a importância do fluxo da energia amorosa e suas diferentes formas de expressão, como um atributo do Feminino a ser conjugado com o Masculino na co-criação da Vida, através de todas as nossas relações, gerando assim sabedoria, crescimento, criatividade, harmonia, arte!

Evento realizado pela Associação Baiana de Arteterapia ASBART http://www.asbart.blogspot.com/
Local do Evento: Espaço Villa do Bem
Rua São Paulo, nº 20, Pituba - Salvador - BA

Mandalas na Arteterapia - eu de novo no programa Consciência Próspera!

Nessa terça-feira, dia 12 de lulho, das 21:30 às 22hs, eu terei o imenso prazer de estar novamente no Programa Consciência Cósmica sendo entrevistada por Samuel Souza de Paula, falando sobre Mandalas na Arteterapia. Dá para participar com perguntas ao vivo pelo chat do programa, ficarei muito feliz se puderem assistir e aprticipar! Para assistir ao programa, pela web, entre no site: http://www.biosegredotv.com.br/ Até lá!!!

28/06/2011

A Curandeira - uma das peças mais lindas e sensíveis que já assisti!

Se puderem, assistam A Curandeira, é imperdível!!!
Assisti 2 vezes em 2009, quando ela esteve em cartaz, e levei os meus alunos da Pós em Arteterapia da UNIP para assisti-la e discuti-la em classe, tamanha a sua riqueza tanto cênica e interpretativa quanto de conteúdo poético-existencial, e por tudo isso podemos traçar muitos paralelos entre o ofício dessa encantadora curandeira arquetípica, que reflete tão belamente o nosso curador-ferido interno, e trabalho em Arteterapia. No decorrer da peça ela narra alguns contos, muitos de origem indiana, muito interessantes também. A peça encanta pela simplicidade do cenário, pela profundidade da interpretação e pela sensibilidade do texto.

“Pra que serve o homem? Pra criar Deus?”, se pergunta a curandeira quando questiona sobre a razão de existir de cada coisa, até uma pedra tem, segundao a curandeira, uma razão de ser especial e necessária à vida...
Única apresentação: 30 de junho, quinta-feira, ás 21hs
Viga Espaço Cênico - Rua Capote Valente, 132
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São Paulo/SP Tel: (11) 3801-1843
Duração do espetáculo: 1 hora e 10 min
Texto e atuação: Adriana Fortes
Direção: Melani Halpern
Dramaturgia: Reinaldo Maia


Sinopse: Uma curandeira caminha, através de histórias e poemas, em busca de solver os males da alma, do pensamento, daqueles sentimentos que a gente nem imagina que podem ser curados. Um caminho de recordações, compartilhado com o público, num jogo de vivências e sua relação com o mundo. Trata-se de um espetáculo onírico, repleto de delicadeza e pitadas de humor.


Assista a um trecho desa peça no vídeo abaixo, e se puder se dê o presente de assisti-la nessa quinta-feira!

15/06/2011

Sarau junino em 18/06 - espero por você lá!!!

Haverá mais um sarau em meu consultório, o primeiro de 2011, estão todos convidadíssimos!!!

Quando?

18 de junho, a partir das 20hs

Onde?

Rua Ministro de Godói, 1267 - Perdizes, São Paulo/SP
O que levar?

Leve sua alegria e talentos para compartilhar conosco! Pode levar também amigos, parentes, namorado(a)s... E não se esqueça de levar o que irá beber e um prato de comida, pois como o sarau é aberto a todos que queiram participar, assim garantimos que não falte comida nem bebida para ninguém. Estou pedindo ainda para quem tiver cobertores, casacos e abrigos que não usem mais, levar que temos para quem doar.
Estarei inaugurando nesse sarau a lojinha: Arterapinna Oficina de Criação e relançando o meu livro da Coleção A Prática da Arteterapia Vol 1: Temas Centrais em Arteterapia, pois a antiga tiragem de 1000 livros já esgotou!

24/05/2011

É sempre um grande prazer dar aulas sobre Jung!!!

“A alma tem milhões de anos, a consciência individual é apenas a florada e a frutificação própria da estação que se desenvolve a partir do rizoma subterrâneo (...) cuja trama das raízes é a mãe universal.” (Jung)





Nos dias 27 e 28 de maio estarei na ALUBRAT dando o seminário:
A Psicologia Analítica de C. G. Jung:crescimento psíquico e transcendência


(Dia 27 – 14h-19; dia 28 das 8h30 as 18h)


PROGRAMA:


• Estrutura e dinâmica da psique segundo a Psicologia Analítica de C. G. Jung

• Os ciclos de desenvolvimento psíquico e o processo de transformação que leva àexpansão da consciência

• As 4 funções da consciência: Pensamento, Sentimento, Intuição, Sensação e suascorrelações com os 4 elementos da Natureza: terra, Água, Fogo e Ar - desenvolvimentoda personalidade e ecologia profunda


• A dimensão do sagrado e o trabalho sobre o mito pessoal: entrelaçando o eu e ooutro na teia da vida cósmica• Alquimia, individuação e transcendência: a jornada da alma humana rumo à totalidade
INSCRIÇÕES: ALUBRAT- São Paulo – Fone: (11) / 5083-1159 / 9344-7778E-mail: saopaulo@alubrat.org.br


Local do evento: Convento Santíssima Trindade – Rua São Benedito,2.146 alto da boavista esquina com R. Américo Brasiliense


Público Alvo: Profissionais que buscam integrar em suas atividades a abordagemTranspessoal e alunos da pós-graduação Alubrat-SPValor do módulo: R$350,00 para alunos visitantes


Estão todos convidados!

Lançamento do livro: Educar com Arteterapia!

Educar não será reprimir, mas ao contrário exprimir, liberar. Também não é imprimir, mas ao contrário, fazer brotar, fazer emergir... Menos ainda seria formar, impondo uma forma; ao contrário, seria desentranhar do mais fundo do ser a sua própria forma. Com efeito, o verbo educar vem do latim educere, e significa tirar fora, levar fora, extrair, desentranhar. Educar o homem significa portanto desentranhar a forma humana de dentro do prórpio homem, extraindo e revelando a sua própria e íntima essência.”
(Ysé Tardan-Masquelier)


Tenho o prazer de compartilhar com voc~es mais um lançamento de um livro que traz contribuições importantes da Arteterapia, no qual eu escrevi o artigo: A SABEDORIA ANCESTRAL: RAÍZES MÍTICAS DA CONSTITUIÇÃO DO SER E DA CONSTRUÇÃO DO SABER (p. 21 a 40), abaixo coloco o resumo do meu capítulo para vocês terem uma idéia do que trata:

RESUMO:
Atualmente, estamos num momento de mudança de paradigma, movido pela crise do racionalismo positivista que separa as luzes das sombras, que contrapõe o sujeito ao objeto, desembocando numa neutralidade desumanizadora. Na educação, esse modelo de ciência refletiu-se na separação quase irreconciliável da teoria da prática, afastando o conhecimento do auto-conhecimento, a crítica da auto-crítica, a razão da sensibilidade, o eu do outro.
Durante séculos privilegiou-se a percepção e o pensamento abstrato, desconsiderando-se a subjetividade, o imaginário, a arte e as emoções como fonte e processo de conhecimento e aprendizagem. Em resposta à fragmentação do saber surge a necessidade de pensar o homem e o processo de produção e transmissão de conhecimentos numa perspectiva simbólica, que contemple a complexidade do ser e que viabilize novas práticas pedagógicas que promovam o desenvolvimento global da personalidade e que contemplem uma perspectiva ético-estética da existência.
Ao se trabalhar com recursos vivenciais e artísticos no contexto escolar, pode-se aliar a consciência matriarcal à patriarcal no processo pedagógico, o que pode ser um caminho para a integração do conhecimento ao auto-conhecimento, possibilitando o resgate da noção de sujeito em sua dimensão renovadora e criativa.


Dados do livro:
Título: EDUCAR COM ARTETERAPIA
propostas e desafios

ORGANIZADORA: GRACIELA ORMEZZANO
244 páginas ISBN/COD. BARRAS: 978-85-7854-122-4 Preço: R$ 42,00
Os textos que compõem esta coletânea abarcam um leque bastante amplo dos processos educativos: os de educação formal, comprometidos com o sistema educacional institucionalizado e hierarquicamente estruturado, que se estendem desde a educação de crianças até a pós-graduação; os de educação não formal, que atendem aos situados à margem do sistema de ensino e se dirigem a promover a inclusão daqueles que o sistema escolar pode ter marginalizado; e os de educação informal, em que o fazer educativo está subordinado ou indiferenciado de outros processos sociais.
Nesse sentido, podemos entender que todo processo terapêutico é um processo educativo informal, porque não surge como algo distinto e predominante na ação, não possui um contorno nítido especificamente educativo e se dá de maneira difusa ou espontânea. A Arteterapia é extremamente inclusiva e pode oferecer algumas saídas para os novos desafios do campo educacional.

04/04/2011

Eu na TV na net! Participem pelo chat ao vivo!!!

Nessa terça-feira, 5 de abril, das 21 às 21:30hs, é com grande alegria que serei entrevistada no programa Consciência Própspera pelo Samuel Souza de Paula, vcs poderão participar dele ao vivo pelo chat, no link: http://www.biosegredotv.com.br/ Adorarei ter a participação de vocês durante o programa!!!


E em 4 de junho irá ao ar pela TV Cultura e TV Brasil a minha entrevista sobre sonhos, no quadro "Ciência doméstica" do programa Almanaque Brasil (foi a Dilaina quem me indicou para essa entrevista, obrigada Dialina!), apresentado por Luciana Mello e Robson Nunes, essa segunda temporada do programa ficará no ar por 39 semanas... Como a filmagem foi na minha sala, no consultório, o fundo ficou lindo, bem colorido, a minha cara!!! Quando estiver no ar aviso vocês...

01/04/2011

Workshop: A COLAGEM E A ARTETERAPIA, estão todos convidados!!!

Dia 21/5 estarei dando um lindo workshop com Silvio Alvarez sobre a arte da colagem e o autoconhecimento, onde os participantes elaborarão colagens a partir do símbolo da Árvore da Vida, com certeza nascerão lindos trabalhos e com eles formaremos uma floresta!!! (sabiam que esse é o ano da floresta?)



A COLAGEM E A ARTETERAPIA:

"SOMOS NATUREZA VESTIDA DE GENTE!"

(As Árvores agradecem!)


(colagem feita por Silvio Alvarez, releitura da "Árvore da Vida" de Klimt)


"Pode ser que alguma pequena raiz da árvore sagrada esteja ainda viva. Nutre ela bem para que ela se cubra de folhas e volte a florescer, se enchendo com o canto dos passarinhos." (Alce Negro)


Nesse workshop Silvio Alvarez, artista plástico, apresentará a técnica da colagem, com sua história e características, mostrando a riqueza desse trabalho e aplicações possíveis. Patrícia Pinna, psicóloga e arteterapeuta, explanará sobre os benefícios da Arteterapia e mostrará como a arte da colagem pode ser empregada como caminho para o autoconhecimento. Patrícia falará ainda sobre o tema da “Árvore da Vida”, recorrente em diversas mitologias, e que sentido isso pode ter para o homem atual, num momento planetário em que as florestas estão sendo sumariamente devastadas, o que se reflete na degradação das relações eu-outro-meio ambiente. Silvio transmitirá então os conceitos básicos da técnica para que os participantes possam desenvolver um trabalho de colagem a partir do tema proposto.



Quando: 21 de maio, sábado, das 15 às 19 horas Investimento: R$ 150,00

Onde: Pinheiros - São Paulo/SP

Maiores informações e inscrições: pelo tel (11) 3032-5554

(falar com Sandra Siciliano, organizadora do evento)

- vagas limitadas! -

*Os participantes deverão trazer 5 ou mais revistas variadas. Outros materiais serão fornecidos por Silvio.

Coordenadores do workshop:

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Patrícia Pinna Bernardo


Coordenadora da Pós-graduação em Arteterapia e em Arteterapia Aplicada: saúde, artes, educação e organizações (UNIP). Psicóloga (USP) e Artista Plástica (FAAP), Pós-doutora em Mitologia Criativa e Arteterapia (FEUSP), Doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano (USP), Mestre em Psicologia Clínica (PUC-SP. Arteterapeuta e psicoterapeuta, atuando há 28 anos com crianças, adolescentes e adultos em consultório, escolas e instituições. Professora Universitária e Supervisora de trabalhos clínicos e institucionais. Negrito



Silvio Alvarez



Artista plástico paulistano, autodidata, trabalha com colagem desde 1989. O artista costuma dizer que a principal matéria-prima do seu trabalho, ainda mais importante do que o papel, é a paciência. Silvio recorta, uma a uma, imagens de revistas ou de folhetos publicitários para compor um mundo todo seu, mágico e surreal. Além de expor e comercializar suas obras, desenvolve projetos especiais para empresas ligados à sustentabilidade e ministra oficinas de colagem para todas as faixas etárias.


A colagem e a Arteterapia

A colagem foi a expressão artística que rompeu com séculos de pintura tradicional, tornando-se o arquétipo de todas as vanguardas que fizeram o século XX e a arte moderna. É uma técnica criativa e divertida, que tem por procedimento juntar na mesma superfície duas ou mais imagens, cada uma de origem diferente da outra. Os primeiros artistas a utilizarem essa técnica foram Pablo Picasso (1881-1973), Georges Braque (1882-1963) e Juan Gris (1887-1927). Outro artista importante que desenvolveu a técnica da colagem como arte foi Henri Matisse (1869-1954).

(...) “Desenhar com a tesoura, recortar as cores vivas, lembra-me o trabalho direto dos escultores… uma tesoura é um instrumento maravilhoso e o papel que uso para os meus recortes é magnífico… trabalhar com a tesoura neste papel é uma ocupação na qual me posso perder… o meu prazer pelo recorte aumenta a cada dia que passa! Por que é que não pensei nisto antes? Cada vez me convenço mais de que com um simples recorte se pode expressar as mesmas coisas do que com o desenho e a pintura…”. (Henry Matisse em “Escritos e Pensamentos sobre a Arte”)

Sentimos que a colagem, além da expressão por meio de renovação de imagens, ao possibilitar a desconstrução e construção de cenas cotidianas, pode atuar como eficiente instrumento arteterapêutico, possibilitando também o treinamento do raciocínio e da coordenação motora.

Podemos comparar a consciência e o ego como a flor e o fruto de uma planta cujas raízes fincam-se profundamente nos arquétipos, que representariam a porção do solo de onde as raízes da planta retiram seus nutrientes básicos. O conjunto das camadas mais profundas do solo representa o inconsciente coletivo. Quanto mais unilateral e rígida for a consciência, ou seja, quanto menor o contato da flor e do fruto com suas raízes, menores serão suas chances de adaptação." (GRINBERG)

O trabalho arteterapêutico permite que nos disponibilizemos ao desbravamento de nossas florestas internas (essa maravilhosa e misteriosa floresta de símbolos que caracteriza a dimensão inconsciente da psique), acessando e aprendendo a trabalhar com o nosso imenso potencial criador. . A linguagem simbólica, falada pelo nosso inconsciente por intermédio de suas imagens, é a mesma utilizada pela arte, e está presente nos contos e mitos de todas as culturas. Através dela, pode-se estabelecer um diálogo amoroso e fluente com nossas raízes e ancestralidade, abrindo-nos ainda para um diálogo com a natureza à nossa volta. . As atividades artísticas podem nos auxiliar na jornada do autoconhecimento (que Jung denominou de processo de individuação), e quando associados à narrativa de mitos e contos, podem nos reconectar a um sentido mais amplo para a nossa existência

08/03/2011

Uma semana no paraíso (parte 2): Filha de Tartaruga, filha da Mãe Terra é!

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Na minha viagem para Fernando de Noronha, durante um mergulho pela baía do Sueste, eu encontrei lindos peixes coloridos - grandes, pequenos, amarelos, roxos, azuis... até um tubarão passou perto de mim! Mas eu soube que por lá havia tartarugas marinhas, e ainda não tinha visto nenhuma... Então eu pedi mentalmente, numa espécie de oração: “tartaruga, por favor, apareça para mim, você é uma representante da Mãe Terra e sua ancestralidade, se você vier aqui eu vou poder escrever sobre você e seu simbolismo no meu blog, e contar sobre o nosso encontro!”... e não é que no minuto seguinte ela apareceu?
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Linda, enorme, ela veio para perto de mim nadando com o seu filho, e depois o filho dela se afastou e ela veio bem abaixo de mim, e nós nadamos juntas por um bom tempo, eu em cima e ela embaixo, ela até deixou que eu acariciasse o seu casco algumas vezes, retirando a areia que encobria os seus desenhos! Ela ia para o fundo do mar, depois ia subindo até a superfície e colocava a cabeça para fora para respirar, e voltava para o findo do mar... A emoção de nadar com uma tartaruga marinha, tão grande, tão generosa na sua aproximação, foi indescritível, me senti em estado de graça! Daí, agora só me resta escrever sobre o seu simbolismo, e compartilhar com os leitores a magia e alegria desse encontro...
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“Tartaurga... Grande Mãe
Alimente meu espírito
Agasalhe meu coração
Para que eu possa servi-la também...”
(J.Sams)
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Carminha Levy e Álvaro Machado, no livro: A Sabedoria dos Animais, colocam a tartaruga como um símbolo relacionado à “sustentação da Mãe Terra”, ela seria a “Senhora das Hierarquias”. A sua “carapaça redonda como o céu e a face plana como a terra” fez com que, para os povos africanos, chineses e japoneses, ela fosse representante do próprio universo, como se o carregasse em suas costas. Na China, por exemplo, ela “aparece como sustentáculo das águas primordiais”, e em tribos norte-americanas é relacionada à “força de renovação trazida pelas águas, personificação da energia feminina”.
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Segundo esses autores, na Índia ela também tem relação com Vishnu, que às vezes pinta o seu rosto de verde “para, lembrando a tartaruga, simbolizar o poder de geração, pois ele surgiu das primeiras águas, carregando a Terra nas costas.” Entre povos indígenas norte-americanos, altaicos, turcos e mongóis, ela está “ligada à história dos semideuses que criaram o mundo (a Avó dos homens, os heróis gêmeos antagonistas, etc.). Ela os salva, os alimenta e os conduz, tornando-se assim intermediária entre a lama primordial, fértil, e os heróis que o Céu Criador entregou à Terra”. Esses autores observam ainda que Hermes criou a cítara ao ver o casco de uma tartaruga de cabeça para baixo, tornando a tartaruga um “emblema da arte da alquimia através dos tempos.” Para algumas tribos amazônicas, a tartaruga simboliza longevidade, sendo também “um emblema feminino”, sendo “associada á forma da vagina e ao papel de esposa do deus Sol”.
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De acordo com Sams e Carson, no livro Cartas Xamânicas, a tartaruga é o símbolo mais antigo que existe, de acordo com as tribos norte-americanas, constituindo-se “na personificação das deusas e também da eterna Mãe, da qual derivam nossas vidas.” Os autores colocam ainda que o símbolo da Tartaruga nos auxilia na conexão com a terra,, nos convidando a “honrar a fonte curadora” presente em nosso interior, favorecendo uma maior conexão com a Terra, e a usarmos “as energias da terra e da água – as duas moradas da Tartaruga” – para olhar a nossa “situação presente de vida fluindo de maneira harmoniosa” e fincando os nossos pés na terra, extraindo dela o nosso poder. A Tartaruga nos ensina a ter os “pés no chão” quando estamos no “mundo da lua”, nos ajudando ainda a focar, desacelerar, relaxar, e com a sua sabedoria nos ensina ainda a esperar com paciência pelo tempo da colheita: “A Tartaruga enterra seus pensamentos na areia, como faz com seus ovos, deixando ao sol a missão de chocá-los”.

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O símbolo da Tartaruga no meu momento atual de vida, ou...
como a Natureza dialoga conosco quando nos sintonizamos com sua linguagem repleta de amor e sabedoria (como São Francisco de Assis já sabia...)

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No dia anterior à minha viagem para Fernando de Noronha, o meu filho me ligou pedindo uma corrente com uma medalha de proteção, pois o escapulário que eu havia dado a ele no Natal tinha a corrente muito grande para ele usar sempre, como ele me disse. Eu achei muito interessante ele, um rapaz de 19 anos, fazer questão de usar uma medalha de proteção dada por mim, sua mãe... Eu me separei do pai dele quando ele tinha 6 anos, e desde os 15 anoso pai quis que ele fosse morar em sua casa, e ele concordou. É claro que eu senti a falta da convivência diária com ele, meu único filho que eu amo de paixão, mas achei que nessa idade seria mesmo muito bom para ele estar mais perto do pai, e decidi que isso seria bom para mim também, era como se eu entrasse na minha segunda adolescência...
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Diante do seu pedido, me dei conta do que isso significava: já que eu não estava mais convivendo com ele no dia-a-dia, era como se a medalha de proteção, com a imagem de Nossa Senhora, ficasse protegendo ele em meu lugar! E eu sabia, desde o dia em que me dei conta que estava grávida, que um dia ele voaria do meu ninho, em busca do seu destino...



Como eu sabia disso (além de ser uma verdade tão óbvia, mas tão dificilmente assimilável por nós, mulheres em sua face Deméter)? Através de um sonho que tive antes mesmo de ter a confirmação por exames que eu estava grávida. Nesse sonho, um pássaro pousava em minha mão, eu fazia carinho nele, ele voava, e depois de um tempo ele retornava para as minhas mãos, eu o acariciava, ele voava de novo... E assim foi!
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“Amar é ter um pássaro pousado no dedo. Quem tem um pássaro pousado no dedo sabe que, a qualquer momento, ele pode voar”
(Rubem Alves)
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Recentemente eu tive um sonho com um pássaro parecido com esse, mas era um pássaro bem maior, e acontecia o mesmo, só que ele não vinha para a minha mão: ele vinha para perto de mim, ficava parado no chão ao meu lado algum tempo ouvindo o que eu dizia (era como se eu estivesse dando alguma aula para um grupo num bosque), voava, depois voltava, e num certo momento ele me deu um abraço (o bom dos sonhos é que tudo pode acontecer, até o abraço de um pássaro com suas asas)!
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Mas voltando ao que eu dizia antes, eu fiz questão de levar para o meu filho a corrente com a imagem de Nossa Senhora antes de viajar, e me dei conta do que eu já sabia e já tinha vivenciado com relação à minha mãe: toda mãe é representante da Grande Mãe, e chega a hora em que essa Grande Mãe atua a partir de dentro, de forma simbólica, quando o filho cresce psicologicamente e ganha autonomia, e então não precisa mais de nós como mães (exceto em certos momentos em que necessitamos de seu colo para ajudar a curar a nossa criança ferida, mas aí a mãe pode ser a mãe mesmo, a amiga, o namorado, a terapeuta...). E se o amor tiver sido cultivado com respeito e doçura durante a fase de maternagem, a relação mãe-filho pode se transformar numa bela e profunda amizade...Como disse Richard Bach em seu livro Ilusões (que eu li na adolescência e nunca me esqueci de alguns pensamentos colocados lá): “o que une uma verdadeira família não são os laços de sangue, mas de respeito e a alegria pela vida um do outro”...
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E assim, chega o momento em que é imprescindível nos reconhecermos como filhos do Universo, da Grande Mãe Terra e do Grande Pai Céu, e procurarmos a nossa própria maneira de estarmos vinculados a eles, a partir do nosso mundo interior. Então, podemos começar a reescrever a nossa história, a nossa lenda pessoal, que nos mitos e contos corresponde à saga dos heróis, quando eles saem de casa e começam finalmente a viver suas próprias vidas, o que é marcado pelos ritos de iniciação dos povos ancestrais. Como diz Pedraza, em seu livro Sobre Eros e Psiqué: “a relação de Psiqué com os seus pais não é o problema a ser enfocado quando se trata de seguir o chamado da alma”. O que resta é perdoar os pais pelos seus erros, que acontecem sempre pelo simples fato de eles serem humanos (e perdoar, como ouvi no outro dia, é abrir mão da expectativa de que as coisas pudessem ter sido diferentes, e aceitar o que foi como um fato com o qual devemos lidar da melhor forma possível), e ter o mesmo sentimento de auto-perdão, de compaixão por eles e por nossa própria humanidade imperfeita por definição, aprendendo a lidar com as nossas sombras e dificuldades com corajosa humildade, e a fazer bom uso dos recursos que recebemos para a lida com a vida (desenvolvendo e expandindo os nossos potenciais, convidando assim os deuses a estarem junto de nós em nossa trajetória existencial), colocando-os, e nos colocando, a serviço dela, como nos ensina tão bem Dioniso... ou seja: a dimensão do sagrado, antes projetada nas figuras parentais, precisa ser realocada, precisamos encontrar no mundo, e no Cosmo, a nossa casa, e um contato íntimo e pessoal com o sagrado é vivenciado então, à maneira de cada um.
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A natureza, a arte e os mitos sempre foram, para mim, um caminho de conexão com essa dimensão, e por isso não posso viver sem o contato com a beleza e com a orientação interior que provém daí... Por isso também, de tempos em tempos, como Merlin, preciso me recolher na floresta, voltar para o útero de Iemanjá para de lá retornar renovada, mergulhar nos livros e escrever os meus próprios livros e poemas, além de dançar, pintar, fazer Yoga, trazendo também a floresta e o mar para dentro da minha vida cotidiana, sempre que possível!
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Esse reencontro com a Grande Mãe, num nível mais profundo do que havia se dado antes, aconteceu na minha viagem para Fernando de Noronha, através do meu encontro tão especial com a Grande Tartaruga Marinha... A minha criança interior, carente de acolhimento pela ferida do abandono que precisava finalmente cicatrizar, encontrou nela o colo de que tanto necessitava para se reconciliar com a alegria de viver, com a ajuda e como coroamento de meu processo terapêutico, já que eu estou num dos momentos de renovação em minha vida... Pois se meu filho está finalmente se tornando um homem maduro, aprendendo a se responsabilizar pela sua própria vida, e a ser um bom pai e uma boa mãe para si mesmo, eu tenho que me preparar para a qualquer momento ser avó! Não que seja para já, não se trata do fato concreto em si, mas potencial...
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Eu, assim como ele, estou entrando num novo nível de amadurecimento psicológico (que é como se fosse sim uma segunda adolescência) – nos antigos rituais de iniciação, os pais do jovem também se preparam para essa transformação, num contato mais significativo com a ancestralidade. E isso significa, portanto, honrar os meus ancestrais: minha mãe, minha avó... até chegar na ancestralidade da alma, mais uma vez honrando a Grande Mãe Terra, fortalecendo os vínculos com as minhas raízes, que vão do âmbito pessoal ao transpessoal, me reconhecendo como filha do Universo e me colocando a serviço do projeto cósmico para a minha alma nessa passagem pela Terra (como diz a minha querida amiga e aluna Suely Marqueis, que é astróloga, o mapa astral consiste em tirar um retrato disso, do projeto cósmico que somos, mostrando a que viemos para cá!).
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Então, diante disso, resta agradecer á minha mãe, que morreu com um pouco mais da idade que eu tenho hoje, pela matéria prima sobre a qual posso trabalhar e transformar, dando a ela a minha própria face de mulher, por viabilizar através de seu ventre e de seus cuidados, que eu estivesse aqui, reconhecendo nela uma mulher que fez o seu melhor, apesar do seu feminino tão ferido... O meu trabalho com o Feminino e com a cura de suas feridas (e a arte é a linguagem do feminino) provavelmente se deve em grande parte a isso... Agradecer à minha querida avó paterna, vovó Maria do Carmo (com quem convivi mais de perto, e com quem eu sou tão parecida fisicamente - os mesmos cabelos negros, os olhos fundos, até na sinusite...), tão querida, camponesa vinda da aldeia de Lamoza (Portugal), que morreu com 103 anos, completamente lúcida e ativa (nunca deixou de morar em sua casa, cuidando da sua horta, galinhas, cozinhando a sua comida e bebendo 1 cálice de vinho em cada refeição!), uma verdadeira Velha Sábia aquariana, que foi quem me ensinou a rezar, a amar e cultivar a terra, e que continua a me acompanhar com o seu olhar carinhoso, a partir das estrelas...
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Minha sobrinha, vovó Maria, meu sobrinho e meu filho... lindos!
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E por fim, agradecer imensamente à Mãe Tartaruga, por me colocar em seu casco e me reapresentar à beleza e aos encantos desse profundo Mar Primordial, de onde tudo vem e para onde tudo retorna quando necessita se renovar... Em uma das histórias de Iemanjá, depois de criar os seus filhos e eles já estarem grandes, casada há anos com um rei, pede a ele um tempo para retornar ao mar... Mas ele não entende essa sua necessidade de recolher-se para reinventar-se, e manda os seus guardas atrás dela para trazê-la de volta. Quando vê-se nessa situação, ela quebra uma garrafa que o seu pai Olokum (orixá dos oceanos) lhe deu quando ela se casou e foi morar longe do mar, dizendo-lhe que, se precisasse dele por estar em apuros, quebrasse a garrafa... E assim as águas que escorreram da garrafa levaram Iemanjá de volta para o mar, de volta para casa, rumo ao reencontro de sua essência, de seu Feminino... Agora me dou conta de que essa viagem para Fernando de Noronha significou para mim isso também - eu precisava me reescrever, criar uma nova história para a minha vida pessoal, me reinventar... O que me remete a um poema que escrevi em 1994, de frente para o mar de Ubatuba, na pousada O Refúgio do Corsário:
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MAR
-
Ouço o seu barulho,
mas no fundo o soar é oco e úmido:
Mar a me acrordar...
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Com o sal solto nas águas,
arde por dentro o seu toque,
como um sol a queimar...
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Acesa, como chama de vela,
deito-me em seus braços,
com o corpo a boiar e a alma a flutuar...
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Mergulho em suas águas como quem volta prá casa
(caracol entrando na concha)
Ostra a perolar...
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É no seu mistério e silêncio
que teço minhas vestes ao contrário:
ao desnudar-me, componho-me,
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Como saída de um orgasmo,
nascida e amolecida,
feita de novo argila,
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Piso a terra e ergo a coluna,
coração batendo, respiração ondulante,
Vida exalada da espuma...
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E prá ele sempre volto:
para o abraço do amante,
para o colo da mãe,
para o ventre de Deus,
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De onde sempre espero
ser de novo parida,
até que possa juntar morte e vida,
e ir ser como voltar...
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E sabem qual o nome da pousada em que eu fiquei lá? Mar Azul... (No pacote que eu fiz pela TAM viagens nós só ficamos sabendo em qual pousada ficaremos quando chegamos lá)